Em 1998, Lars Grael velejava em Vitória, ES, quando foi atropelado por uma lancha, perdeu uma perna e muito sangue. Seu coração parou de bater. Lars teve uma experiência de quase-morte. Nas palavras do próprio, "é uma coisa muito difícil de descrever". O médico José Carlos Ramos de Oliveira, outro sobrevivente de parada cardíaca, endossa Lars: "só quem passou por isso sabe do que estou falando".
"Indescritível" é o adjetivo que mais aparece nos relatos de EQMs. A experiência é inefável – impossível de ser reproduzida com fidelidade em palavras. Ao que parece, a comunicação flui sem linguagem, os sentidos não atuam do jeito regular e nada se assemelha muito às coisas deste mundo. Isso não ajuda muito a compreensão daqueles que, como eu e quase todos os estudiosos do fenômeno (não sei quanto a você), nunca estiveram do lado de lá.
Apesar da dificuldade em verbalizar a experiência, os relatos de EQMs são muito mais claros e detalhados que narrativas de sonhos ou de alucinações por drogas. Os depoimentos são semelhantes, mas nunca iguais. Algumas pessoas "flutuam" sobre o próprio corpo e observam o trabalho dos médicos; outras são guiadas por parentes mortos até uma luz brilhante. O túnel, descrito por tantos, assume formas diversas. "A maioria disse ter visto um túnel longo e escuro, mas outros o descreveram como um caleidoscópio ou um túnel de ladrilhos coloridos", afirma o médico britânico Sam Parnia, da Universidade Cornell, em Nova York, EUA.
Era preciso criar critérios para avaliar um fenômeno com tantas variações. Em 1980, o psicólogo americano Kenneth Ring dividiu em 5 fases seqüenciais os eventos da EQM (veja infográfico na pág. 53) – nem sempre eles seguem a ordem do esquema, contudo. Em outro esforço metodológico, Bruce Greyson, psiquiatra da Universidade da Virgínia, EUA, elaborou uma escala em que 16 das ocorrências mais comuns de uma experiência de quase-morte ganham conceito 0, 1 ou 2. Na escala Greyson, a nota mínima de uma EQM legítima é 7 em 32.
Se os roteiros são aleatórios e nunca se repetem, as impressões deixadas pela experiência raramente fogem de um padrão. "Apenas 3% das experiências de quase-morte são negativas", diz a psicóloga Willoughby Britton, da Universidade do Arizona, EUA. Mesmo quem teme arder no inferno experimenta algo descrito como paz, serenidade ou bem-estar. "Isso foi observado até em suicidas que são ressuscitados", afirma José Zacarias Souza, professor de filosofia que integra um grupo interdisciplinar da PUC-SP. "Esses pacientes aprendem a valorizar a vida, não tentam se matar de novo."
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